domingo, abril 16, 2006

XXIII

#1

Nós:
Não somos mais que uma casca de noz, quando não somos uma casca de nós.

#2

Ouçam:
Quando um sonido se torna em zoado e este ascende a ruído,
ensurdecedor barulho que nos ofusca os sentidos
até às entranhas.

#3

Só o mais frágil perdura.
Que o tempo (incessante como ele só) trabalha contra toda a dureza adamantina.

#4

Eis a gotícula.
Pinga que pinga até tocar no fundo das coisa.

#5

Para quê viajar, se nunca saímos de nós?

#6

Salta a pulga. Saltem pulgas, que vós nunca sereis humanos.

#8

Olhem, mas não vejam.
Que o horror nunca vos toque as pupilas.

#9

O espaço é todo o espaço do Mundo.
Mas o tempo é o fiel das almas.

#10

Sem a desgraça como poderíamos aprender a ser felizes?

#11

Gentil alma, não t'evoles, que ainda não chegou o teu tempo.

#12

O Ser, sem saber, é ditoso?

#13

A matéria toca-nos de muito perto.

#14

Será a natureza do enigma o horror e o medo?

#15

Embalamos a vida com todos os cuidados.
E, no entanto, somos nós que por ela somos tidos.

#16

Interrogação lapidar:
Se eu não existisse, ainda haveria Mundo?

#17

Mesmo quando todas as palavras forem ditas, ainda poderemos escutar.

#18

O Sol é uma alegria de luz ou o horror da claridade?

#19

Vivam, mas não em contemplação.
Para que o tempo vos não ultrapasse.

#20

Se trabalhais de Sol a Sol, podeis viver durante a lua?

#21

Jamais digas a Palavra Final.
Pois, quem te garante que, uma vez proferida, não termina também o Mundo?

#22

Uma criança brinca e um velho morre.
Que tristeza quando os termos se invertem.

#23

Nunca prometas, para que o Destino não contrarie as tuas honestas intenções.

Sem comentários: