sexta-feira, outubro 19, 2007

O Anjo e a Obra III.

Toda a ideia anunciada, quando se tem de converter em palavra, corre - poucos o ignoram - sério risco de desvanecer, ficando aquém da promessa da dimensão salvívica de puro verbo banhado de luz; pois a escrita é no tempo e o aceno mera ideia, confusa em si no ainda-não-verbalizado. É nessa fase que o intelectivo-intuir, a intuição-relâmpago que tudo abarca e acolhe, mergulha ao cerne sem fim da máquina-roda do mundo.
Por outro lado, o discurso acena-nos em seu próprio fluxo vibracional, de tal modo e maneira que a uma palavra se deve, necessariamente, seguir outra, ou seja, a escrita estabelece a sua própria ordem de continuação requisitando-a e impondo-a ao autor, sem que este tenha completo controlo no devir da escrita. Esta autonomização coincide com a máxima de que a formação é a forma, e, bem assim, de que o conteúdo é a forma e também o inverso. O acto-escrita consubstancia a escrita-obra numa relação de imanência (de fusão, de imbricação) distanciada esquizofrenicamente da intenção originária, dos processos causais da sua formação. Permanece então o Anjo-daimon no devir criativo, original e originário, da obra.

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